Desde que o novo coronavírus chegou ao Brasil, em março de 2020, governantes têm implementado medidas para diminuir o contágio de Covid-19. O principal desafio até então consiste em encontrar estratégias capazes de salvar vidas e proteger a economia simultaneamente.
Após mais de dois meses em quarentena, em alguns lugares mais rígida e em outros menos, a retomada das atividades começa a acontecer gradualmente durante os meses de maio e junho com uma série de restrições ou adaptações. Contudo, algumas prefeituras têm proibido o aluguel de temporada, como em Gramado (RS), Paraty (RJ) e Bonito (MS).
As Procuradorias dessas cidades, onde a atividade turística é a responsável por boa parte da arrecadação, entraram na Justiça para suspender anúncios de plataformas como o Airbnb, a Booking.com e a Expedia. Mas o que chama a atenção é que o setor hoteleiro não encontrou dificuldade para voltar a operar em determinadas localidades.
Neste artigo, reunimos as principais informações sobre a proibição do aluguel de temporada durante a pandemia. A boa notícia é que em alguns casos, como em Gramado, a Justiça já autorizou o retorno da locação de curta duração, após suspendê-la por 79 dias. Mas o imbróglio está longe de acabar, já que a situação esbarra em uma eventual regulamentação da atividade. Veja:
As cidades afetadas pela proibição do aluguel de temporada
De acordo com esta reportagem, as prefeituras dos seguintes municípios editaram decretos para proibir o aluguel de temporada por meio das Online Travel Agencies (OTAs) ou plataformas digitais recentemente:
- Bonito (MS);
- Caldas Novas (GO);
- Ilhabela (SP);
- Gramado (RS);
- Guarapari (ES);
- Paraty (RJ);
- São Sebastião (SP);
- Teresópolis (RJ).
A maioria dos decretos não está mais vigente ou foi derrubada judicialmente. No entanto, em alguns lugares, como em Paraty, onde o impasse chegou até o Supremo Tribunal Federal (STF), os aluguéis devem ter duração mínima de 15 dias desde 1º de maio.
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O que dizem as prefeituras?
Há mais de uma justificativa apresentada pelos municípios que proibiram ou suspenderam o aluguel de temporada. A principal delas está relacionada à contenção do fluxo turístico, já que muitas pessoas têm se isolado em cidades de praia ou de interior, onde o sistema de saúde costuma ser mais limitado.
Porém, há causas mais específicas para a discriminação entre aluguel por temporada e hotelaria, que aconteceu na principal cidade da serra gaúcha, por exemplo. De acordo com esta matéria, a proibição da atividade é devido ao desrespeito dos decretos anteriores por proprietários, administradores e imobiliárias.
No entanto, alguns proprietários rebateram essas acusações, principalmente aqueles que possuem CNPJ. Esses, formalizados, garantem ter respeitado as imposições, já que, do contrário, teriam perdido os seus alvarás de funcionamento e ainda seriam obrigados a pagar R$ 10 mil de multa diária. Consideramos completamente injusto proibir a locação de temporada para todos porque alguns poucos desrespeitaram o decreto, não acha?
Outra explicação para a proibição citada no artigo diz que, diferentemente dos hotéis, o aluguel de temporada não têm como funcionar parcialmente, ainda segundo a notícia do jornal do Rio Grande do Sul. Esta outra reportagem justifica a proibição em Gramado devido à dificuldade de fiscalizar imóveis de temporada, diferentemente da hotelaria.
O que dizem proprietários, administradores e sites de aluguel de temporada?
Como é de se esperar, quem trabalha com aluguel de temporada e teve que suspender as atividades ficou bastante frustrado. Principalmente quando viu hotéis serem reabertos sem a possibilidade de receber visitantes nas casas ou apartamentos alugados por temporada.
Ainda que o impedimento tenha sido derrubado judicialmente, proprietários e administradores da serra gaúcha organizaram-se em torno de uma associação para reivindicar os seus direitos. Eles alegam que pagam todos os impostos cabíveis e que, portanto, não haveria justificativa para a proibição do aluguel de temporada.
Já o Airbnb disse em nota que lançou recentemente um Programa Avançado de Limpeza. Trata-se de um protocolo padronizado de higienização e desinfecção para o setor, o que garante o exercício do aluguel de temporada em segurança. Tanto o Airbnb, quanto a Booking.com garantiram que orientaram os anfitriões a respeitarem as medidas impostas pelo governo. Ao mesmo tempo, questionaram na Justiça os decretos que consideraram abusivos.
Por aqui, devemos destacar que o aluguel de temporada pode funcionar no período atual porque contribui para o distanciamento social. Isso porque, nesse formato, não há a mesma aglomeração de pessoas que pode acontecer em determinados espaços dos hotéis, como em elevadores, lobby e recepção. Principalmente se estivermos falando de casas de temporada isoladas ou remotas.
Também é válido mencionar que grande parte dos espaços de temporada possui cozinha própria. Isso, por sua vez, permite aos hóspedes fazer as suas refeições e comer em casa, sem contato com os demais, diferentemente do que acontece em um quarto de hotel.
Como a Serra Gaúcha derrubou a suspensão da atividade
A recém criada Associação de Locação por Temporada da Serra Gaúcha (ASTG) foi quem capitaneou a volta do aluguel de temporada em Gramado e região desde 3 de junho. “Para proteger os milhares de empregos gerados pela atividade, seus empreendedores diretos e, também, a grossa e crescente fatia do mercado que a atividade influencia, de modo que continuaremos investindo, crescendo e nos desenvolvendo e, sobretudo, trabalhando lado a lado com os Poderes Públicos Municipais”, justifica a associação.
Em troca do decreto que derrubou a proibição do aluguel de temporada, os anfitriões da serra gaúcha comprometeram-se a executar as seguintes ações:
- Cumprir as exigências sanitárias impostas pelo poder público;
- Identificar os imóveis seguros com um selo;
- Cadastrar esses espaços em uma plataforma digital durante a pandemia para que as prefeituras saibam quem está seguindo as determinações;
- Assinar, junto aos hóspedes, um termo de compromisso com as regras de controle e enfrentamento à pandemia Covid-19;
- Utilizar um contrato de aluguel por temporada.
A importância da regulamentação da locação de curta duração
Para nós, da Stays, episódios como esse refletem a necessidade de regulamentação do aluguel de temporada no Brasil. Já publicamos, inclusive, um artigo a respeito dos projetos de lei sobre aluguel de temporada no Brasil. Essa discussão corre em paralelo à cobrança de um imposto sobre aluguel de temporada, assunto que nós também já abordamos aqui no blog.
Sem uma lei específica que oriente a prática, propriedades de temporada e anfitriões continuarão sofrendo a pressão da indústria hoteleira, que se sente lesada devido à concorrência. Hoje, o aluguel de temporada é respaldado pelo artigo 48 da Lei 8.245/1991, também conhecida por Lei do Inquilinato, que pode envolver o pagamento de inúmeros tributos: IPTU, IRPF, IRPJ, CSLL, PIS/Pasep, Cofins, ISS, ITBI, contribuição para Seguridade Social, entre outros.
Com diretrizes mais específicas, haverá menos chances de interferências como essas que aconteceram recentemente e que consideramos injusta. Principalmente se as nossas pautas forem levantadas por uma associação que reúna agências, administradores e proprietários de imóveis de temporada a nível nacional.
É de extrema importância que haja uma voz unificada para frear ações abusivas que impactem o setor, não é? Até porque esse é um assunto que costuma dividir opiniões. A ASTG, por exemplo, é contrária à cobrança de qualquer tributo adicional àqueles já pagos.
Da nossa parte, pode ficar tranquilo que iremos batalhar pela consolidação do aluguel de temporada no Brasil, principalmente no período pós-pandêmico. Vamos nessa? Se ficou com alguma dúvida ou tem algo a acrescentar, inclusive sobre a regulamentação da atividade, use o espaço abaixo dos comentários.
3 comentários em “Covid-19: Por que Gramado e outras cidades chegaram a proibir o aluguel de temporada?”
Aqui em Guarujá (SP) também estamos com restrição desde Março por conta da COVID-19 … Tenho alguns espaços de locação por sites e estou passando algumas dificuldades, já que além da proibição temos o bloqueio na entrada da cidade para carros com placa de outras cidades e que não estejam envolvidos em trabalhos essenciais.
Isto é ilegal !!! As prefeituras não podem impedir o ir e vir de moradores inquilinos só porque a placa do carro deles é de outra cidade… O que as prefeituras querem é dinheiro, seja por ISS indevido pelos locadores de imóveis ou por IPVA de veículo registrado na cidade, sob pena da circulação do veículo ser ilegalmente impedida, por autoridades que agem como milícias…
Esse lobby político do trade hoteleiro nas prefeituras já é antigo. Existe desde o tempo em que surgiram as OTAs no Brasil. Além de modernizar o setor hoteleiro, a tecnologia dessas plataformas de hospedagem também transformaram o arcaico negócio imobiliário de locações por temporada – que é um modal de acomodação importante, principalmente em tempos de pandemia com a economia em crise…
A pandemia agora se tornou o apelo dramático das autoridades, principalmente nas cidades em que os hoteleiros tem ‘poderes’ para intervir nos negócios imobiliários da locação por temporada…
Mas, a coisa só piora quando os proprietários locadores de imóveis resolvem ceder aos hoteleiros – representados pelas prefeituras – e abandonam a proteção legal da constituição federal e da lei do inquilinato para ‘formalizar’ sua atividade junto às prefeituras…
Ao criar um CNPJ e abrir uma empresa de hospedagem, invés de entrar para o trade e ficar amiguinho dos hoteleiros, os proprietários locadores de imóveis perdem a privacidade dos seus imóveis e ficam expostos à fúria de uma fiscalização municipal corrupta e teleguiada…
Com o modelo de negócio onerado e transformado numa espécie de ‘hotelaria de segunda classe’, a locação por temporada perde sua característica de residência privada – e seu potencial competitivo pode se tornar inviável a médio prazo…
É preciso manter os direitos constitucionais dos proprietários locadores de imóveis – que já pagam impostos legais e não precisam de autorização das prefeituras para alugar seus imóveis a quem quer que seja…
É preciso manter os direitos dos locatários – que preferem alugar imóveis privados a se hospedarem em hotéis, modelo de negócio mau adaptado à essa crise econômico-sanitária mundial.